segunda-feira, agosto 25, 2003

Inauguração

Esta entrada marca a inauguração do meu blog. Ao que parece, o ultimo hype da net são os blogs. Confesso que normalmente resisto um bocado a dar atenção a hypes, mesmo quando não os conheco, podem até ser algo de interessante. Creio que uma das coisas que me motivou para criar um blog foi o do José Pacheco Pereira, chamado "abrupto". Achei incrível como ele é capaz de escrever tanto com tanta frequência...

Qual é a ideia de criar um blog? Será só criar um por criar? Também, admito. Mas também me ocorre outras coisas para ir pondo aqui: frequentemente me ocorrem ideias que me dão algum gozo pensar, daí que talvez seja interessante publica-las aqui, não as deixando morrer na espuma dos dias.

Hoje é domingo, dia de Marcelo Rebelo de Sousa no Jornal Nacional da TVI. Costumo ouvi-lo sempre, com mais ou menos atenção. De hoje, o que me ficou na memória foi a análise do discurso de reentree do PS, com o discurso longo, cansado, bota-abaixo do Ferro Rodrigues, e as argoladas da (ex?)embaixadora Ana Gomes.

Nunca gostei do Ferro Rodrigues. Quando ministro do Guterres sempre tive a imagem de uma pessoa honesta, séria, mas na verdade isso sempre foi a imagem que a comunicação social passou dele. Não me recordo de o ouvir em entrevista nessa altura. Depois da saída (desistência?) de Guterres, e após o PS andar um bocado baralhado (desesperado?), falou-se primeiro de Jaime Gama, mas depois acabou por ser o Ferro Rodrigues a suceder a Guterres. Sublinho, suceder. E acho que quem conhece política, e estando Portugal numa democracia, suceder significa tentar continuar o trabalho de um antecessor, mas a uma fasquia abaixo (se assim não fosse, não era sucessor, mas sim antecessor, passo a confusão). Ferro Rodrigues tentou continuar o trabalho de Guterres, mas a um nível abaixo, em dois aspectos: no que respeita ao combate político, Ferro não tem a classe e subtileza de Guterres, pelo que tem sempre atacado o Durão Barroso de uma forma demasiado irritada e emocional, roçando o ataque pessoal (Guterres tinha por hábito ser muito cordial nas relações pessoais, mas atacar de uma forma feroz as políticas); e no que respeita o projecto político, dificil seria, sendo sucessor de Guterres, propor um projecto alternatico a Guterres, pelo que a única coisa que foi capaz de propor na campanha eleitoral foi a continuação de Guterres, de que naquela altura o País estava farto.

Mas Ferro Rodrigues, apesar de nunca o ter confessado claramente, apresenta-se sempre com um ar cansado, agastado. O que será que lhe vai na alma? Ele é o lider do PS, pelo que está amarrado, crucificado, ao papel de uma pessoa energica, com garra, um lider. No entanto isso não cola lá muito bem com aquilo que ele transmite corporalmente, pelas expressões faciais por exemplo. Alguns musculos da cara têm a curiosa propriedade de reagirem directamente ao estado emocional da pessoa, e não são (facilmente) controlados voluntariamente. Por outro lado, o nosso inconsciente reage directamente às expressões faciais das pessoas que vemos. Há uma comunicação subliminar quando ocorre contacto visual entre duas pessoas, que não se passa ao nível do consciente. E o que se sente de Ferro Rodrigues é que ele não está lá muito motivado para o papel de lider do PS. Estas reflexões pareceram-me muito mais claras quando li a transcrição na Visão de uma conversa telefónica entre Ferro e António Costa, a serem verdade. E o que li nas entrelinhas, no discurso subliminar, ao nível do que o inconsciente de Ferro quer exprimir, é que ser lider do PS está a ser um calvário para Ferro Rodrigues. Ele usa esse termo, calvário, para descrever o que ele tem sentido ao percorrer o país, tentando fazer passar a sua mensagem (enfadonha, quem tem paciência para o ouvir?), em que os media teimam em falar do caso de pedofilia. Mas o que eu extraí dessas palavras é que, ao nível do inconsciente, ele esta cansado e farto de ser lider. Ele sente-se obrigado a fazer este papel de lider, pela sua carreira politica. Mas no seu intimo, acredito que ele queira fazer outra coisa qualquer. Mas como ele é uma pessoa solidária com o PS, e como o PS náo dispôe de alternativa a Ferro, a esta distância das proximas eleições legislativas, ele vai levando o barco, carregando a cruz, até que o clima político mude, e se torne relevante o PS ter um lider a altura de um partido de poder, alternativo ao PSD, que mais legislatura, menos legislatura, mais ano menos ano, vai entrar em decadência, e irá ter que ser substituido. O meu medo é que tenha que ser substituido por um partido ao nível que está o PS nestes dias...

Sobre Ana Gomes, não tenho muito a dizer. Na altura em que Timor ocupava as 24h dos noticiarios (deixavam de fazer jornalismo, e começaram a fazer política activa, ainda que por uma boa causa!), os media passaram a imagem que muito devíamos a Ana Gomes. Não conheci as suas acções ao pormenor de perceber porquê, mas admito que a imagem corresponda ao seu valor como embaixadora. Quando uma pessoa é excelente num cargo, dificilmente será igualmente boa (ou melhor) noutro cargo, excepto se for na mesma linha. Ser militante do PS náo está na mesma linha, pelo que, apesar das suas qualidades, só se podia esperar uma Ana Gomes ao nível de uma militante comum, sem grande brio. O problema é que o PS não percebeu isso, e pretendeu usa-la com base na boa imagem que ela tinha. Mas ela tinha boa imagem como embaixadora, náo como política! Isto explica, a meu ver, como a actuação dela como política tem sido muito sofrivel. Nesta semana ela levantou uma polémica completamente dispensável, desconhecendo a posição do PS em anteriores momentos. Lembrei-me da argolada de José Lamego (do PS), quando veio fazer uma conferência de imprensa, sobre Timor, tendo sido logo após violentamente desmentido por, alas, a propria Ana Gomes. Mas nessa altura Ana Gomes ainda não era militante do PS...